Marcha em
Porto Alegre pede o fim da intolerância religiosa
- 21/01/2016 22h54
- Porto Alegre
Camila
Maciel – Enviada especial
Pelo oitavo ano, a Marcha pela
Vida e Liberdade Religiosa percorreu as principais ruas da capital gaúchaMarcelo
Camargo/Agência Brasil
“Intolerância religiosa é a face
mais perversa do racismo”, disse hoje (21) Baba Diba de Iemanjá, sacerdote
africanista e presidente do Conselho do Povo de Terreiro do Rio Grande do Sul,
durante a Marcha pela Vida e Liberdade Religiosa, que percorreu nesta
quinta-feira as ruas do centro de Porto Alegre. É o oitavo ano que a caminhada
ocorre na capital gaúcha no Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa.
Nesta edição, a marcha foi uma atividade do Fórum Social Temático.
Ao som de tambores, com
vestimentas brancas e cantorias, diversos terreiros do Rio Grande do Sul se
encontraram no Largo Glênio Peres e seguiram até o Largo Zumbi dos Palmares.
“[A marcha] surgiu como ato político para dar visibilidade à intolerância
religiosa e também à luta pela reivindicação de direitos, direitos sociais,
pela garantia do Estado laico e também para tentar diálogo com as outas
religiões”, informou Baba Diba.
Baba Diba lembrou os ataques a
terreiros do entorno do Distrito FederalMarcelo Camargo/Agência Brasil
O dia 21 de janeiro é uma
referência a ataques sofridos por Mãe Gilda, que teve a casa invadida por
grupos evangélicos após uma foto dela ter sido colocada na capa da Folha
Universal com o título “Macumbeiros charlatões lesam o bolso e a vida dos
clientes”.
A casa dela foi apedrejada e o
marido agredido verbalmente. Gildásia dos Santos, nome de registro, não
suportou os ataques e, após enfartar, faleceu em 21 de janeiro de 2000.
Baba Diba lembrou os ataques
incendiários em terreiros do entorno do Distrito Federal. Foram pelo menos três
no ano passado. “Quanto mais avançamos em política pública, em discussões que
tentam aproximar as tradições, o racismo muda de status e passa de
velado à revelado. Aqui ainda não incendiaram terreiros, mas no país já. Por
isso, precisamos estar nas ruas e fazer desse dia o dia nacional de combate à
intolerância religiosa.”
A ministra das Mulheres,
Igualdade Racial e Direitos Humanos, Nilma Lino, participou da marcha e
destacou o evento como um momento de celebração da força ancestral africana.
“Ainda temos de lutar muito pela
tolerância religiosa. O Brasil é uma democracia, um país de diversos e todos os
credos e religiões têm de ser respeitadas e ter lugar”, acrescentou a ministra.
Sobre os ataques ocorridos
no Distrito Federal, Nilma Lino afirmou que a Ouvidoria do órgão tem
acompanhado o caso e prestado atendimento às vítimas.
A funcionária pública Júlia
Kolatayó, 37 anos, não falava de religiosidade. “A sociedade nos julga pelos
olhares. Agora que tenho militado bastante na questão social e na religião
africana, tenho conseguido me afirmar mais, mas é bem difícil, porque já perdi
emprego, cargo, cursos." Ela foi batizada com 25 anos e sofreu resistência
da família católica quando decidiu mudar de religião.
Embora não seja de religião
africana, o analista de sistemas Alexandre Hahn disse que também enfrenta
preconceitos por conta da religião de bruxaria Wicca. “Não é todo lugar e
momento que posso dizer que sou bruxo. Quando digo, a primeira pergunta que vem
à cabeça é se faço magia negra. Magia não tem cor. Se vou numa entrevista de
emprego, pentagrama é sempre dentro da camiseta. Não posso mostrar. Rosário,
uso aqui hoje, mas não posso usar em todo lugar.”
Para a ministra Nilma Lino, o
Brasil é um país de diversos e todos os credos têm de ser respeitadosMarcelo
Camargo/Agência Brasil
Michel Borges, o Pai Maicon de
Oxalá, foi criado na religião africanista no município de Santa Maria. Segundo
ele, a relação do terreiro com a comunidade foi construída através de uma
aproximação ao longo dos anos.
“Temos a festa de Natal, das
crianças, das mães. Assim, estabelecemos uma relação com as pessoas e todos
respeitam.”
Maria de Fátima Rodrigues também
nasceu na religião. “Minha mãe diz que eu tinha 24 dias quando passei a fazer
parte da religião.” Maria de Fátima lembrou que a estratégia para estabelecer
um vínculo com a comunidade foi reunir crianças em uma ação de empoderamento da
cultura negra.
Edição: Armando
Cardoso