Conciliação é a melhor
alternativa para o Judiciário, diz ministro Marco Aurélio Buzzi
2 de
dezembro de 2015, 9h36
Entusiasta das práticas autocompositivas no
Judiciário brasileiro, o ministro do Superior Tribunal de Justiça Marco Aurélio
Buzzi participa do Movimento da Conciliação desde a criação do grupo, em 2006,
pela então presidente do Conselho Nacional de Justiça, ministra Ellen Gracie.
Recentemente, presidiu o grupo de trabalho instituído pelo presidente do CNJ,
ministro Ricardo Lewandowski, que estabeleceu novos parâmetros curriculares
para a formação de conciliadores e mediadores, buscando atender determinações
do novo Código de Processo Civil.
Em entrevista sobre os cinco anos
da Resolução 125, que instituiu a política judiciária nacional de solução de
conflitos, o ministro do STJ faz uma avaliação da efetividade do ato normativo
e as consequências de sua implantação para o Judiciário brasileiro. Com
informações da Assessoria de Imprensa do CNJ.
Leia a
entrevista:
O Poder Judiciário brasileiro precisava de uma
política nacional de solução de conflitos, quando da instituição da Resolução
CNJ 125?
Marco Aurélio Buzzi — O
Brasil é um dos países que, proporcionalmente, tem o maior número de processos
no mundo. Quase um processo para cada dois habitantes. Temos também,
proporcionalmente, o maior tribunal do mundo, que é o Tribunal de
Justiça de São Paulo. Portanto, com esses dados todos, nós chegamos a uma
conclusão de que, realmente com esse índice de litigiosidade, a nossa
mentalidade precisa ser modificada. Na época, em 2010, quando foi criada a
Resolução CNJ 125, uma das grandes preocupações do professor Kazuo Watanabe,
que liderava o grupo de juristas e colaboradores que deu ensejo a essa
resolução, era montar núcleos e centrais de conciliação que pudessem dar essa
alternativa aos jurisdicionados e aos operadores do Direito. Uma alternativa
mais rápida, muito mais barata e em que os próprios interessados procurassem
construir uma solução para os seus problemas e, com isso, a pacificação social
passasse a ser muito mais intensa, pois quando as partes constroem o acordo são
elas mesmas que estão elaborando as condições de solução do conflito. Então,
quando você faz o acordo, a chance de você resolver o conflito sociológico que
existe por trás de toda a lide é muito maior.
E o senhor acha que nesses cinco anos a resolução
cumpriu seu papel?
Marco Aurélio Buzzi — O
processo judicial e a sentença, que são grandes conquistas da sociedade — e
ninguém é contra o processo —, por via de regra solucionam a questão
processual, e não o conflito que há por trás. Por exemplo, numa ação
possessória, a sentença resolve aquele conflito que foi trazido à Justiça, mas
não pacifica as pessoas. Eu fui juiz do interior e tive várias demandas em que
eu, muito inábil naquela época, dei uma belíssima sentença confirmada por todas
as instâncias superiores e que foram terríveis, muito inadequadas para o
momento no aspecto do conflito sociológico. Mais tarde, eu aprendi que, antes
de proferir uma sentença dessas, eu deveria chamar as pessoas não só para
tentar compor quanto à lide em si, mas também para explicar as possíveis
soluções consequentes e que as pessoas teriam que continuar convivendo como
vizinhos de modo pacífico e civilizado. Não precisam se transformar em melhores
amigos, mas conviver civilizadamente. Na história recente, a Resolução 125, a
meu ver, veio como passo número um de mudança de mentalidade. Tanto é que eu
creio firmemente que é em razão da Resolução 125 que está vindo a Lei 13.140, a
lei da mediação, assim como o novo Código de Processo Civil.
O senhor que acompanha as mudanças nos tribunais do
país, como avalia essa implementação?
Marco Aurélio Buzzi — Eu acho
que temos dois enfoques a dar. O primeiro é que estamos em uma fase de mudança
de mentalidade. Então, há quem esteja mais convicto de que esse é o caminho e
há quem não esteja muito entusiasmado. O segundo enfoque é que realmente os
números são muito bons. Temos em São Paulo, por exemplo, que é o carro-chefe da
economia do país, aproximadamente 175 centros judiciários de Solução de
Conflitos e Cidadania (Cejuscs) já instalados. E, em todos os estados, já temos
Cejuscs instalados, em alguns mais, outros menos, mas existem em todos. Minha
avaliação é muitíssimo positiva. Estamos mudando a mentalidade e essas metas
estão se concretizando. Em todo o Brasil, felizmente, estamos com operadores do
Direito engajados nisso, os juízes, os promotores os advogados e, agora,
estamos com duas leis tratando da questão, lei da mediação e o novo Código de
Processo Civil.
O senhor presidiu o Grupo de Trabalho que criou
novos parâmetros curriculares na formação de mediadores e conciliadores. Essa
unificação também pode ser vista como avanço?
Marco Aurélio Buzzi — Todas as
regiões do Brasil já receberam cursos de conciliação e mediação. Agora, com os
novos parâmetros curriculares estabelecidos, fixados pelo grupo de trabalho
criado pelo ministro Lewandowski exatamente para esse fim, será feita uma
formação uniforme em todo o país. A vantagem é que agora há parâmetros para
orientar, havendo liberdade para ajustes por parte dos tribunais, desde que
obedeçam esses parâmetros básicos. Hoje, temos no Brasil métodos muito
diferentes de formação, que chegam a ser divorciados em alguns lugares no país.
No que o Brasil precisa ainda avançar nesse
quesito?
Marco Aurélio Buzzi — Eu creio que a mudança de mentalidade é a principal questão e penso que o caminho está nas universidades. No ano que vem, muito provavelmente, teremos que dar uma atenção especial ao currículo das faculdades de Direito. Porque, se antes era uma questão opcional, agora não. Para os alunos de faculdade temos de ensinar Direito, e o Direito agora diz que a solução de conflitos é lei. Não se trata só de uma política do CNJ. Será que as faculdades não vão ensinar a nova lei de mediação e o novo Código de Processo Civil? Essa fase inicial de mudança de mentalidade, com muita convicção, foi vencida, e as novas leis provam essa grande vitória. Em todos os tribunais, já existem os Núcleos Permanentes de Solução de Conflitos, também previstos com muito mérito na Resolução CNJ 125, que são a gerência dos Cejuscs de cada tribunal. O que precisamos agora é aperfeiçoar o sistema.
Qual o futuro da conciliação no Brasil?
Marco Aurélio Buzzi — Se ela
não é a alternativa, é uma delas. Creio que essas práticas vão cada vez mais se
aperfeiçoar, se instalar e ficar conhecidas. Porque é um método simples e
barato para as partes e para o Estado em termos de tempo e de custos. Li em uma
revista nesta semana uma reportagem muito interessante sobre as empresas que
estão ouvindo os consumidores e modificando suas estruturas internas para
atender os usuários. É isso. Precisamos ter mais diálogo, troca positiva de
impressões, fazer às vezes troca de posições para que um pense com a
perspectiva do outro. Dessa forma, teremos cada vez mais não só a solução da
lide, mas também do conflito. Teremos a pacificação social que se busca. Nós
precisamos chegar lá para reduzir esse número de processos que temos no
país.
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